Origens e transformações das grandes empresas brasileiras de implementos rodoviários – Pág. 61 a 74

Origens e transformações das grandes empresas brasileiras de implementos rodoviários – Pág. 61 a 74

Autores/as

  • Armando Dalla Costa

Resumen

RESUMO

 

A produção de caminhões no Brasil é dominada por empresas multinacionais de capital estrangeiro, mas de forma peculiar o mercado de implementos rodoviários é quase totalmente dominado por empresas nacionais construídas ao longo dos últimos 50 anos. Muitas delas competitivas internacionalmente, estão em expansão e com vocação para serem multinacionais. Assim, surge a pergunta: por que não nasceram montadoras de caminhões nacionais, mas sim empresas de implementos? Além disso quais são as características das quatro grandes empresas do setor que

dominam cerca de 75% do mercado: Randon; Guerra; Facchini; e Noma. Procurar uma resposta a

estas questões é o objetivo deste texto.                                                                                                          61

 

Palavras-chave: implementos rodoviários; empresa familiar; crescimento.

 

 

 

ABSTRACT

 

Truck production in Brazil is dominated by multinational companies with foreign capital, but the pecu- liar situation of road equipment market is almost totally dominated by national companies built over past 50 years. Many internationally competitive, expansion and destined to be multinationals. Thus arise the question of why truck manufacturers have not been born nationals, but companies’ imple- ments. Furthermore what ate the characteristics of the four big companies that dominate the industry about 75% of the market: Randon; Guerra; Facchini; and Noma.

 

Key-works: road equipment; family enterprise, expansion.

 

 

 

 

 

 

* Doutor pela Université de Paris III (Sorbonne Nouvelle) e Pós-Doutor pela Université de Picardie Jules Verne, Amiens. Profes- sor no Departamento de Economia e no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico da Universidade Fed- eral do Paraná. Coordenador do Núcleo de Pesquisa em Economia Empresarial (www.empresas.ufpr.br).

 

** Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal do Paraná, membro do Núcleo de Pesquisa em Economia Empresarial - NUPEM. Bolsista do CNPq.

 

 

  1. 1. INTRODUÇÃO

 

A construção da indústria automobilística brasileira, mais especificamente relacionada aos caminhões, tem início de fato em meados da década de 1950, quando Juscelino Kubitschek (JK), como parte da sua plataforma de governo e planos modernização do país, passa a dar prioridade ao transporte rodoviário e à indústria automobilística como peça fundamental do processo de industrialização e integração nacional. Entretanto o processo de construção da indústria automobilística nacional teve como característica privilegiar a vinda de grandes montadoras mundiais a fim de fazer a instalação unidades fabris e manter alto grau de nacionalização dos seus produtos.

 

Assim sendo, a maioria do mercado passou a ser dominado por empresas montadoras de origem estrangeira, tanto que em uma rápida leitura do livro “Indústria Automobilística Brasileira 50 Anos” editado pela ANFAVEA1  (2006) fica evidente o domínio quase completo de empresas estrangeiras. No mercado de caminhões é fácil citar nomes como Scania e Volvo (Suécia), Mercedes e VW-MAN (Alemanha), Iveco-Fiat (Itália), Ford (Estados Unidos). Durante o processo de evolução as empresas nacionais como a estadual Fábrica Nacional de Motores (FNM) foi privatizada na década de 1960 e adquirida pela italiana Alpha Romeu, mais tarde adquirida pela Iveco-Fiat. Outro exemplo era a Engesa que faliu no começo da década de 1990 devido a ingerências administrativas e desmonte da indústria de defesa brasileira, onde obtinha seus maiores ganhos especialmente no ramo de veículos militares. A única sobrevivente relevante foi a Agrale ativa em nichos específicos do mercado de caminhões, abrangendo a linha leve e semi-pesada, mas com uma porcentagem ínfima em relação ao mercado

de caminhões como um tudo.

 

Dentro do segmento de caminhões as empresas brasileiras cresceram e se tornaram competitivas

62            em mercados adjacentes ao das montadoras de caminhões, onde viram a oportundidade de preencher nichos não atendidos pelas multinacionais. Assim sendo, forma-se um ambiente propício para a criação de grandes empresas no setor de implementos rodoviários, cujos equipamentos servem para complementar e dar melhor adaptabilidade aos modelos de caminhões oferecidos pelas montadoras.

 

Entre as empresas do segmento de implementos rodoviários as quatro que se destacam (Randon, Guerra, Noma e Facchini) detêm cerca de 75% do mercado e nasceram e cresceram de forma adjacente ao crescimento das atividades das montadoras de caminhões estrangeiros desde os anos

1950/1960. A pesar de deter histórias diferentes se tornaram firmas competitivas e capazes de se

aventurar em  novos mercados no exterior  e em  segmentos como autopeças, máquinas e equipamentos. Desse cenário emerge a questão de como essas empresas conseguiram se firmar em uma indústria tão competitiva, mas que não se arriscaram em produzir caminhões, diferente da história de países como os Estados Unidos e a China.

 

O trabalho está organizado em quatro seções em que o foco é a comparação e comportamento das quatro principais empresas de implementos rodoviários brasileiros. A primeira apresenta a base teórica que dá suporte à discussão na visão micro de por que as firmas cresceram e qual era a situação de proteção do mercado. A segunda apresenta o que é o mercado de implementos rodoviários e qual o seu cenário de desenvolvimento ao longo das décadas. A terceira é uma visão histórica de quem são

as quatro grandes empresas do setor. Por fim é feita uma análise comparativa das empresas.

 

 

 

 

1 Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores que reúne os fabricantes de veículos automotores, incluindo carros, caminhões, tratores entre outros que detêm unidades fabris em território brasileiro.

 

 

 

  1. 2. NOÇÕES SOBRE CRESCIMENTO DA FIRMA E POLÍTICA INDUSTRIAL

 

A criação das grandes firmas brasileiras de implementos rodoviários estudadas nesse trabalho tem uma relação íntima com a política industrial praticada no Brasil até a década de 1980, denominada genericamente de modelo de susbstituição de importações (ISI), onde o protecionismo e incentivo estadual eram vistos como benéfícos para o estabelecimento de uma estrutura industrial. De acordo com Katz (2005, p. 421 - 424) o modelo de ISI pressupõe genericamente a atuação articulada de três agentes: (i) o Estado como um motor do crescimento econômico, provedor de “bens públicos” e realizador de investimentos que a iniciativa privada não tinha interesse em fazê-lo, tais como infra- estrutura; (ii) a proteção do mercado interno e o incentivo ao crescimento das empresas nacionais; e (iii) a partir dos anos 1950 a atração de investimentos estrangeiros a fim de implantar unidades fabris para a produção de bens industriais sofisticados e de elevado investimento.

 

Além do mais, especialmente ao longo do governo militar como observa Macarini (2007), o pensamento da Escola Superior de Guerra (ESG) defendia a “construção do poder nacional brasileiro” que trazia consigo a necessidade do incentivo a construção da grande empresa privada nacional conjugada com a mais forte atuação estadual afim de criar uma estrutura estável. José Flávio Pécora, secretário- geral do Ministério da Fazenda, observava a respeito: “Parece-nos importante que haja grupos privados

brasileiros, grandes, que levariam o sistema a uma situação de equilíbrio mais desejável”.

 

O ISI suscita discussões sobre os efeitos frente ao desenvolvimento das empresas, especialmente quando se discute o que aconteceu com as empresas dos “tigres asiáticos2” e América Latina. Os primeiros adotaram uma política industrial voltada para o exterior e visando a exportação para alavancar a industrialização denominada de export-led e, da América Latina, um modelo de industrialização

voltado para dentro baseado no ISI. Autores como Lall (2005) e Pack (2005) defendem que o modelo         63

adotado pelos tigres asiáticos forçava as empresas a desenvolverem tecnologia e buscarem inovações

para se manterem competitivas afim de conquistar mercado externo, mas que não ocorria na América Latina na medida em que as empresas eram protegidas da competição e, assim, poderiam ser ineficientes. Entretanto, autores como Katz (2005) e Cimoli et al. (2003) contra-argumentam que as empresas latino-americanas desenvolviam inovaçãoes e tecnologia, verificada no crescimento da produtividade, sofisticação dos produtos e busca por mercados externos extrapolados na década de

1970, mas que começaram a entrar em dificuldades com a crise dos anos 1980.

 

Na década de 1990, o modelo de ISI começa a ser desmontado e ocorre a onda de privatizações, reformas visando a redução do tamanho do Estado e abertura dos mercados que provocaram a reestruturação econômica dos países da América Latina. A pesar desse movimento para um mercado mais competitivo, muitas grandes empresas brasileiras sobreviveram  e buscaram fazer frente a competição estrangeira, inclusive em busca da internacionalização de seus negócios passando a ser genuinas empresas multinaiconais brasileiras. Como exemplo podem ser citados a Votorantim, Odebrecht, Gerdau, EMBRAER, Petrobras, BR Foods (fusão entre Sadia e Perdigão), JBS-Friboi,

Vale.

 

 

 

 

 

 

 

 

2 Normalmente a expressão se refere aos países: Hong Kong; Coreia do Sul; Singapura; Taiwan. Em que pese que a Coréia do

Sul costuma ser vista como o grande exemplo de sucesso no processo de industrialização.

 

 

 

Ao analisar profundamente a empresa podemos citar o trabalho de Nelson e Winter (1982) denominado “An Evolutionary Theory of Economic Chance” uma das obras seminais para a criação do pensamento evolucionário. De um lado, a obra resgata o pensamento schumpeteriano da inovação como motor do crescimento econômico e chave para o sucesso de um agente frente à concorrência. De outro, utiliza elementos da biologia para explicar a dinâmica de concorrência e por que determinados agentes têm sucesso em relação a outros. No aspecto empresarial isso quer dizer que as firmas mais adaptadas tendem a superar as menos adaptadas, conquistando maiores fatias de participação no mercado e novos mercados, gerlamente recaindo sobre as firmas que mais inovam e detêm vantagens genéticas sobre as demais dado o ambiente em que estão inseridas.

 

Recentemente, Teece (2005, p 149) defende que a empresa apresenta dois aspectos no seu desenvolvimento. Um é como alavancar os ativos existentes para negócios novos e/ou afins. O outro, como apreender, combinar e recombinar os ativos para estabelecer novos negócios e voltar-se para novos mercados. A palavra “ativos” invocada por Teece (2005, p. 156 -157) refere-se as vantagens da empresa ligadas a sua característica singular. Por exemplo, as capacidades tecnológicas próprias da companhia e a sua localização. Ambos importantes para explicar o sucesso competitivo de cada companhia frente as demais do mesmo setor. Em linha semelhante Malerba (2005) argumenta que a trajetória de evolução de uma indústria depende do ambiente em que ela está inserida, pois influencia na seleção das empresas mais aptas e que tipos de produtos e serviços serão mais demandados pelo mercado.

 

 

  1. 3. EMPRESAS BRASILEIRAS DE IMPLEMENTOS RODOVIÁRIOS

 

A definição do que é a indústria de implementos rodoviários utilizada nesse trabalho é emprestada da

64            Randon (2008), líder do setor, que a def ine como as empresas que f ornecem acessórios e complementos aos caminhões dando-lhe uma função no transporte de cargas, que abrange os produtos veículos rebocados, nomeadamente, reboques, semi-reboques e superestruturas e acessórios, como caçambas e carrocerias sobre chassi, eixos auxiliares e quinta-roda. Em outras palavras, quer dizer

que todos os caminhões fabricados no país necessitam de algum implemento.

 

A origem das empresas de implementos rodoviários no Brasil é mais antiga do que a existência da indústria de caminhões, mas ganhou impulso com a opção pelo sistema rodiário e vinda das grandes montadoras estrangeiras a partir da década de 1950. A maioria dos embriões das empresas médias/ grandes do setor tinham origem em pequenas oficinas, frequentemente familiares, especializadas em manter os caminhões da época em operação através de consertos improvisados e, mais tarde, da produção de implementos para melhorar a adequabilidade dos caminhões comercializados no Brasil. Por isso que quando a ANFIR3  (2009) conta a história das empresas fundadoras acaba contando a história de pequenas oficinas que deram origem a firmas industriais a partir da década de 1950.

 

Das milhares de pequenas oficinas que surgiram algumas começaram a se destacar e eliminar os concorrentes dentro da região que atuavam, paulatinamente cominhando para serem empresas nacionais em busca de atender o crescente mercado advindo do aumento da venda de caminhões e

maior integração nacional. Beneficiadas pelo incetivo proposital do Estado ao fortalecimento das

 

 

 

 

 

3 Associação Nacional dos Fabricantes de Implementos Rodoviários.

 

 

 

pequenas empresas do país dando suporte ao modelo de industrialização com base no ISI observado por Katz (2005, p. 421 - 422). Adicionalmente, como observa Studart (2005, p. 112 - 113), o financiamento dessas empresas se deu basicamente através do auto-financiamento devido à possibilidade de imposição de mark-up dado num ambiente propício em virtude do crescimento econômico e da inflação elevada.

 

A pesar de ser um mercado jovem e em expansão algumas firmas passaram a se destacar. Em parte, seguindo a linha de Teece (2005), explicada pela sua composição de ativos que lhe proporcionava vantagens competitivas, especialmente a localização e capacidade de oferecer produtos desejados pelos clientes. A localização das oficinas de sucesso quase sempre se dava onde ocorria um grande fluxo de caminhões, normalmente oriundo de alguma atividade econômica que exigia o tranporte rodoviário. Por exemplo, Caxias do Sul-RS com grande atividade madeireira e, posteriormente, pelo metal-mecânico. Outro exemplo é a região de Maringá-PR grande produtora de café e, mais tarde, de grãos. Mesmo hoje centenas de pequenas e médias oficinas sobrevivem em regiões do Brasil de

grande fluxo de caminhões, a pesar da concorrência das grandes empresas.

 

A capacidade de oferecer produtos adequados aos clientes estava ligada a uma indústria em formação e em busca de um padrão adequado ao Brasil. Poucas oficinas tinham a capacidade e sensibilidade de compreender essas necessidades do mercado, mas as que entenderam começaram a crescer e desenvolver produtos cada vez mais adequados. Dessa forma, como observa Malerba (2005), ajudou a moldar essa indústria de implementos em certa direção e criar padrões realmente brasileiros. Estes padrões, após a abertura da economia, permitiram uma grande competitividade sobre países em desenvolvimento com características de transporte semelhantes à brasileira e, indiretamente, se proteger naturalmente da importação de bens estrangeiros. Em paralero, relembrando Katz (2005),

as empresas do setor desenvolveram tecnologias próprias e inéditas a nível mundial para se manterem competitivas no mercado interno. Um dos exemplos pioneiros foi a Randon criar um sistema de         65

suspensão de semi-reboques para rodar em estradas mal conservadas no fim da década de 1960 ou, na década de 2000, a introdução dos bitrens para aumentar a capacidade de transporte de cargas dos cavalos-mecânicos.

 

No Brasil, segundo a randon (2009), cerca de 60% do transporte de cargas é efetuado por via rodoviária e, a pesar de cair proporcionalmente,  continua aumentando em volume devido ao crescimento econômico. Para se ter uma ideia do tamanho do mercado, em dezembro de 2007, a frota nacional de veículos habilitados ao transporte de carga era de 1,67 milhão, dos quais 329,4 mil eram de reboques e semi-reboques. A produção anual de reboques e semi-reboques, os itens mais importantes dessa indústria gira em torno de 30 mil unidades

 

Na medida em que o setor ganhava importância e as empresas cresciam, surgiu a necessidade da criação de uma entidade que congregasse as companhias e lutasse pelos interesses do setor. Assim, as grandes companhias do setor começaram a conversar a fim de criar uma entidade em comum, semelhante a ANFAVEA (Associação Nacional de Fabricante de Veículos Automotores), culminando com a fundação da ANFIR (Associação Nacional dos Fabricantes de Implementos Rodoviários) em

1980 com sede em Caxias do Sul - RS, em 1982 transferida para São Paulo (Anfir, 2009, p. 15 - 16). Atualmente a Anfir congrega 152 associados e 1.775 afiliados, abrangendo micro, pequenas, médias e grandes empresas ligadas ao segmento de transporte de cargas.

 

A estrutura de mercado do setor é altamente concetrada em quatro empresas que detêm cerca de

75% do mercado, a saber: Randon; Guerra; Facchini; e Noma (ver Figura 1). As duas primeiras da cidade de Caxias do Sul - RS, a Facchini de São Paulo e Noma de Maringá - Pr.

 

 

 

Figura 1 - Implementos Rodoviários: concentração de mercado (dados de 2006)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fonte: Anfir (2009).

 

Os outros 25% do mercado são ocupados principalmente por empresas médias e grandes, que têm potencial para galgarem maior participação no mercado e reduzirem o atual quadro de contrato no mercado. Como exemplos podem ser citadas três companhias: Pastre; Schiffer; e Rossetti.

 

- Pastre (2010): localizada na região metropolitana de Curitiba - PR, fundada em 1974 pela família Pastre, originada de uma oficina especializada em caminhões. Possui um plano de expansão que consiste em dobrar o seu tamanho entre 2008 e 2012.

 

- Schiffer (2010): originária da região de Ponta Grossa - PR, fundada em 1938 pelos irmãos Schiffer a

66            fim de atender a demanda por equipamento para a indústria madeireira, e que na década de 1960 passa a atuar no ramo de implementos rodoviários.

 

- Rossetti (2010): fundada pelos irmãos Rossetti em 1997, originários da cisão da tradicional empresa de implementos rodoviários Iderol criada na década de 1960. A sede está localizada em Betim - MG.

 

A concentração de mercado em apenas quatro grandes companhias é o foco na sequência do trabalho, com o objetivo de aprofundar como essas firmas estabeleceram a sua estratégia de consolidação frente ao mercado e como se expandiram. Simultaneamente, considerando a relação delas com as montadoras internacionais instaladas no Brasil e, frequentemente, buscando se associar e não competir no segmento de caminhões.

 

 

  1. 4. HISTÓRIA DAS “QUATRO GRANDES”

 

A história das quatro grandes se refere às empresas que detêm mais de 75% do mercado de implementos rodoviários brasileiros: Randon; Guerra; Facchini; e Noma. Nesse item o objetivo é investigar três fases dessas empresas que consiste na origem, desenvolvimento e situação atual. O que constitui um resgate histórico de quem são essas empresas e a forma de dar suporte a análise feita na próxima seção.

 

4.1. Origens

 

 

As quatro grandes apresentam como características recorrentes: (i) nasceram em regiões que demandavam crescentes serviços de transporte devido ao crescimento das atividades econômicas;

 

 

 

(ii) apresentam uma forte correlação com famílias de imigrantes; (iii) oriundas quase sempre de pequenas oficinas e de um negócio tradicional de família.

 

As gaúchas Randon e Guerra nasceram na região de Caxias do Sul, uma região colonizada por italianos. Nas décadas de 1940/1950 tinha como principal atividade a extração de madeira e caminhava paulatinamente para ser um pólo da indústria metal-mecânica que é hoje. Além do mais é uma região cercada por serras, com estradas toscas convivendo com grande tráfego de caminhões. Assim, criava um ambiente propício para que pequenas oficinas ofereceram serviços de consertos e produção de peças de reposição, haja visto que a maioria dos componentes dos caminhões eram importados.

 

A Randon foi fundada pelos irmãos Raul Anselmo e Hercílio Randon em 1952, oficializando a oficina que mantinham informalmente desde o fim da década de 1940, quando especialmente Hercílio se dedicava ao conserto de motores a combustão e equipamentos agrícolas. A família Randon de ascendência italiana, fixada no Rio Grande do Sul no fim do século XIX, era humilde, mas  vivia com certa dignidade. O pai dos irmãos, Abramo, se dedicou a consertos mecânicos em geral e manteve sua oficina na qual Raul e Hercílio deram os primeiros passos no mundo da mecânica (MDIC, 2009). Inicialmente, o principal produto da oficina era um sistema de freios, considerado excelente e melhor que os sistemas de freios originais dos caminhões da época. Para o fim da década de 1950, a Randon passou a produzir implementos rodoviários e os primeiros semi-reboques, foi uma das pioneiras do

setor.

 

A Guerra S/A foi fundada por Ângelo Francisco Guerra, descendente de italianos, no começo da década de 1970, mas a origem remonta a sua antecedente Guerra & Irmãos, fundada em 1948, inicialmente dedicada a produção de carroções de tração animal (Guerra, 2010). A produção de

carroças é uma atividade relativamente simples e artesanal, dominada pela família Guerra há gerações

e muito demandada pelos colonos da região. Porém o desenvolvimento do transporte rodoviário         67

impulsionou a produção dos primeiros implementos rodoviários em 1950, consistindo em carrocerias para transporte de madeira, em 1952, na instalação de terceiro eixo e, em 1960, o primeiro semi- reboque (Guerra, 2010).

 

A Facchini nasceu em 1950 na cidade de Votuporanga, interior de São Paulo, região povoada por imigrantes italianos e cuja principal atividade econômica era a moveleira. Inicialmente, a Facchini consistia numa pequena marcenaria voltada para o conserto de charretes, chefiada por Euclides Facchini, neto de imigrantes italianos e pai de Rubens, Euclides Junior e mais cinco filhos, que se dedicavam a fabricar carrocerias para caminhões. A demanda por transporte de móveis levou a família a investir na produção de carrocerias de madeira para caminhões, muito modestas. Só aumentou a produção quando Rubens, autodenominado o “mais cara-de-pau da família”, conheceu o tamanho e produção das fábricas de caminhões de São Paulo, sobretudo da General Motors (Sindlab, 2006). Quando retornou conseguiu convencer a família que as carrocerias para caminhões eram um ótimo negócio, mas a expansão se deu ao fabricar implementos para caminhões leves e semi-pesados, especialmente carrocerias de madeira e, mais tarde, furgões (ou baús fechados) de aço e alumínio.

 

A Noma do Brasil S. A. foi fundada em 1967, chamada pelo nome fantasia de “Brasmacânica”, estava localizada na Rua Guarani, em Maringá - PR (Noma, 2010). O negócio inicial da companhia era venda de peças, consertos, reformas e fabricação de terceiro-eixo para caminhões. Na época, a região norte do Paraná começava a ser domesticada e se transformar numa das maiores produtoras de grãos do Brasil, onde quase todo o transporte da produção era realizado por caminhões. A primeira diferença da Noma para as demais é que foi fundada pelo descendente do japonês, João Noma, nascido em Tupã, interior paulista. A família tinha imigrado do Japão, em Okayama, para o Brasil na década de 1920. A segunda é que a mecânica não era bem o negócio da família, tanto que Ryoishi

 

 

 

Noma era caminhoneiro e transportava com um caminhão FNM café da região para o Porto de Paranaguá. Na verdade foi João quem, aos 16 anos, convenceu o pai a ajudá-lo a comprar torno- mecânico e máquina de solda e abrir uma oficina para caminhões na década de 1960 (Gazeta Mercantil,

2009).

 

4.2. Desenvolvimento

 

O crescimento das “quatro grandes” acompanha o ganho de importância da indústria automobilística e aumento da produção de caminhões. Assim, na medida em que as montadoras internacionais desembarcam no Brasil, tal como Mercedes-Benz, Scania, Ford, General Motors, Dodge, Fiat-Iveco, as fabricantes de implementos deslocam o seu foco de negócio cada vez mais para a produção de implementos e outros produtos complementares. Ao mesmo tempo em que as estradas melhoram e a demanda por transporte rodoviário cresce, vai dando margem à introdução de novos produtos como terceiros-eixos e semi-reboques. Equipamentos que não despertam o interesse das montadoras e que precisam ser muito específicos para operar dentro das condições brasileiras, muito mais duras que as europeias e norte-americanas, como também, a forma de pensar o transporte é diferente.

 

Entre as características em comum pode-se destacar: (i) inicialmente concentrar o seu foco de produtos para a maior demanda da região, quase sempre relacionada à atividade econômica predominante. (ii) A associação com as montadoras de caminhões é bem vista como forma de alavancar a expansão, inclusive no cenário internacional e (iii) a busca pelo aprimoramento dos produtos é constante. Outra característica que pode ser considerada é a criação de serviços financeiros, principalmente consórcios, para facilitar a venda de seus produtos e driblar a falta de crédito na economia brasileira.

 

A Randon é um caso particular dessas quatro empresas. Na década de 1950, a companhia se consolida

68            como líder no setor de implementos rodoviários, a sua fama de produtos robustos e de qualideade se espalha pelo país, as vendas crescem e trazem a oportunidade de uma estratégia agressiva de expansão. Foi sintetizada na inauguração de filiais da Randon em Porto Alegre em 1960, seguida por uma série de pontos de revenda e assistência técnica espalhadas por todo o país (RANDON, 2009).

Em destaque temos a filial de São Paulo, inaugurada em 1965, que poucos anos depois se transformou na primeira planta industrial do grupo fora do Rio Grande do Sul objetivando atender o mercado mais pulsante do país que era a região sudeste, especialmente São Paulo. Ao mesmo tempo, o número de funcionários passou de poucas dezenas na década de 1950 para 300 em 1963 e 615 em 1969.

 

Na década de 1970, a Randon aprofunda a sua reestruturação administrativa em busca de viabilizar a expansão não apenas no mercado de implementos rodoviários, mas principalmente no ramo de veículos especiais. Por isso a abertura de capital e entrada na bolsa de valores foi uma das opções dos irmãos, seguida da inauguração de uma nova fábrica em Caxias do Sul. Como complemento a esta estratégia vieram: a aquisição da principal concorrente denominada “Mecânica Rodoviária” também de Caxias do Sul; a primeira grande exportação com destino a África; a criação da divisão de veículos a qual objetivava construir caminhões voltados para construção civil, mineração e transporte de peças industriais de grandes proporções, utilizando respectivamente tecnologia sueca e francesa (Randon,

2009).

 

O problema é que a crise dos anos 1980 levou a companhia a se frustrar com os investimentos e se ver em extrema dificuldade, sendo obrigada a pedir concordata no período entre 1982 - 1984, em que ocorre uma reestruturação radical de sua concepção de negócio (Randon, 2009). Primeiramente, a companhia passa a focar no seu tradicional ramo de atividade, os implementos rodoviários, afim de superar a crise. Logo depois, reorganiza a divisão de veículos especiais passando a dar foco em caminhões voltados para a mineração e construção civil, passando a ser líder do segmento. Após a

 

 

 

década de 1980 a companhia passa a ver com bons olhos a diversificação rumo ao mercado de autopeças, utilizando o seu know-how adquirido durante anos e que fizeram a fama da Randon, mas associada a multinacionais como forma de reduzir riscos, eliminar possíveis concorrentes e manter alto nível de competitividade. Assim, a Randon desponta nos anos 1990 como um conglomerado de empresas que produzem equipamentos relacionados aos caminhões.

 

A Guerra & Irmãos tem uma história de expansão tão agressiva quanto a Randon, que a transformou na sua principal rival. Como resultado, em 1962 altera a sua razão social para Guerra & Marchett e, em 1964, muda novamente para Mecânica Rodoviária S/A. Entretanto, a expansão e reestruturação criaram problemas que levaram Ângelo Francisco Guerra, o fundador, a vender sua participação acionária na companhia e, em 1970, criar uma nova companhia de implementos denominada Guerra S/A. Localizada na cidade de Caxias do Sul, no Bairro Ciro, iniciou as atividades fabris de fato em abril de 1971 com um modesto quadro de 20 funcionários e parque fabril com 7 mil m² construídos e 20 mil

no total.

 

Em 1972, a Guerra inaugura uma unidade montadora em São Paulo, em um prédio alugado, localizado na Rua Tenente Amaro Felicíssimo da Silveira, número 100, no Parque Novo Mundo, capital. Em

1980, a filial São Paulo foi transferida para instalações próprias, na cidade de Guarulhos,  contando com uma estrutura de 17,3 mil m² e uma área construída de 2,3 mil m², seguida da Unidade número II com área total de 38.000 m2. Em 1982, diante de uma mudança na forma de comercialização e de uma necessidade de maior abrangência do mercado, a empresa mudou sua política de distribuição, começando a organizar uma rede de distribuidores em todo o território nacional. No fim dos anos

1980, quando a marca se consolidava, a Guerra foi convidada pela montadora de caminhões Scania, líder no segmento de cavalos-mecânicos, a desenvolver uma marca específica de carretas para os

seus caminhões. Assim nasce em 1989 a marca CHARGE, exclusiva para as concessionárias e caminhões Scania. Também foi importante que acompanhou a Scania na sua busca por novos         69

mercados nos países do conesul nos anos 1990 e criação de sua rede de distribuição no MERCOSUL (Guerra, 2010).

 

A Facchini tinha como público alvo implemento para caminhões leves, semi-pesados e pesados, especialmente o seu conceituado furgão de aço e alumínio. Inicialmente foram feitos para atender a demanda local dos fabricantes de móveis de Votuporanga. Porém os empresários e caminhoneiros da região tinham grandes reticências em adotar o novo implemento, mas a estratégia adotada pela empresa segundo Rubens Facchini foi “decidimos dar furgões de brinde para convencê-los” (SindLab,

2006). Enquanto Euclides Facchini esteve à frente da empresa não ocorreram grandes saltos, apenas a companhia se consolidou. Porém quando Euclides se aposentou em 1996, seus filhos, Rubens e Euclides Jr., passaram a ser agressivos na busca de novos nichos e na expansão da firma.

 

A Noma dá um grande salto no começo da década de 1970, quando passa a ocupar um novo parque fabril de 5 mil m². Assim, a companhia conseguiu ampliar a produção para a média de 35 truks ao mês e montar basculantes sobre chassis. O passo seguinte foi a inauguração de uma nova unidade fabril já em 1975, na cidade vizinha de Sarandi, contanto com uma área de 95.846 m² e com área construída de 11.375 m². O objetivo da nova unidade fabril era produzir semi-reboques, em especial as graneleiras e basculantes muito utilizadas no transporte de grãos e insumos para a produção agrícola como adubo e calcário, além de tanques para transporte de combustível. Em 1988, a Noma do Brasil S. A. incorporou a concorrente mais próxima, a Truck Maringá, que além de fabricar terceiro-eixo e basculantes sobre chassis detinha a marca de semi-reboques “Kume”. Em 1989, a convite da Scania do Brasil, a Noma inícia a comercialização de seus produtos no mercado internacional ao exportar 32 semi-reboques para o Chile (Noma, 2010). Nesse negócio a Noma foi habilidosa em aproveitar a intenção da Scania em conquistar o mercado latino-americano, dominado por caminhões usados

 

 

 

provenientes especialmente dos EUA. Anos mais tarde isso impulsionou a Noma a criar uma rede de representantes nos países do MERCOSUL, Bolívia, Chile e Equador.

 

4.3. Quadro atual

 

 

Na década de 2000, as quatro companhias despontavam com as características em comum de: (i) empresas que se mantinham sob o controle das mesmas famílias que as f undaram, mas administradas de forma moderna e em busca de serem competitivas no mercado; (ii) o investimento em pesquisa e desenvolvimento para sustentar a sua competitividade no mercado nacional e internacional; (iii) a associação com as companhias de caminhões nacionais passa a ser comum e uma forma de abrir novos mercados; e (iv) mais recentemente, o início de uma expansão mais agressiva sobre o mercado de auto-peças e no cenário internacional.

 

A Randon vem se consolidando como uma das grandes empresas privadas brasileiras, em fase de expansão como atesta o ex-presidente Raul Anselmo Randon no Relatório da Administração 2008, ao dizer que “nosso plano plurianual de expansão anunciado em 2005 com visão até 2009, está contemplado em suas metas básicas de expansão, geração de empregos, geração de impostos ao lado da manutenção e ampliação da liderança Randon, antecipadamente materializados” (Randon,

2009b). O controle acionário do Grupo é exercido pela Dramd Administração e Participações Ltda que é uma holding familiar, mas não é negligenciada a importância de investidores nacionais e

internacionais.

 

Segundo o atual presidente do Grupo Randon, David Abramo Randon, o objetivo é chegar a 2015 ent re  as cinc o lí deres globais do  set or de im plem ent os rodoviários.  E m  2009,  o  G rupo

registrou uma receita bruta total de R$  3,7  bilhões.  As companhias do grupo trabalham integradas,

70            divididas em três setores. O primeiro de implementos e veículos, composto pela Randon (a controladora do grupo e que fabrica implementos), Randon Implementos para Transporte, Randon Argentina e Randon Veículos. O segundo de autopeças e componentes, formado por Master, Jost, Fras-le, Suspensy e Casterch. Por fim o de serviços financeiros ou sistemas de aquisição formado pela Randon

Consórcios (Randon, 2009b).  Entretanto a Randon não entrou no segmento de caminhões convencionais, isto é, os que rodam no trânsito urbano e rodoviário, mas sim prefere não competir com as multinacionais que atuam no setor. Existem duas explicações complementares para esse fato. A primeira é que a pesar de ter um nome forte, teria que enfrentar a capacidade de marketing e a história de companhias com mais de 50 anos de Brasil, mesmo sendo multinacionais, que firmaram o seu nome no segmento de transporte nacional contando com uma capacidade de mobilização de recursos enorme. O segundo é que o investimento para desenvolver o projeto de uma linha de caminhões, colocar em produção, criar a rede de assistência técnica e de revenda é complexo e exige maiores recursos do que a de veículos especiais e implementos.

 

A Guerra S/A conta com quatro unidades produtivas: Caxias do Sul, Farroupilha, Guarulhos e Argen- tina. Produz cerca de mil unidades mensais de reboques e semi-reboques, 460 kits 3º eixo, além de peças de reposição para a manutenção de produtos, conta com mais de 1.600 funcionários (Guerra,

2010b). O que chama a atenção na composição do parque fabril da Guerra é a unidade na argentina

recentemente inaugurada, mas fundada como forma de ocupar o mercado argentino de semi-reboques, especialmente considerando a posição argentina de grande produtor agrícola e que transporta a maioria de sua produção via rodoviária. A Guerra conta com mais de 10 mil clientes ativos e cerca de

90 mil produtos em operação no mercado brasileiro. A rede de assistência técnica em território brasileiro consiste em 57 pontos de serviços autorizados, 42 casas de distribuição e 80 concessionárias. No mercado externo atua em 16 países, especialmente na América Latina, onde detém a única unidade fabril no exterior localizada na Argentina (Guerra, 2010b). Em 2007 o faturamento da empresa atingiu

 

 

 

R$ 468 milhões (U$ 45 milhões em exportações) e crescimento de 54% sobre o ano anterior (142% em exportações). O lucro líquido chegou a R$ 6,7 milhões (já descontado prejuízo de R$ 11,1 milhões apurado em 2006) (Intelog, 2008).

 

Entretanto, no segundo semestre de 2008, a Guerra foi vendida para o grupo francês Axxon Group, financiado pelo banco de desenvolvimento alemão DEG, depois de mais de oito meses de negociações (Intelog, 2008). O grupo francês Axxon Group não é uma grande empresa de implementos rodoviários ou de transporte, mas sim um grupo que procura investimentos em empresas médias (faturamento anual entre R$ 20 milhões e R$ 200 milhões) dos mais diversos setores. O que não espanta, pois não existem mega empresas montadoras de implementos rodoviários como existem no segmento de caminhões e nem mesmo as grandes montadoras de caminhões ou de autopeças têm interesse em se dedicar a fabricação de implementos rodoviários. É uma característica de mercado.

 

A Facchini passou a oferecer implementos para caminhões pesados e bater de frente com a líder do mercado, a Randon. A organização da companhia é altamente verticalizada, a empresa construiu, em

2008, uma fábrica exclusivamente dedicada à produção de peças, onde são feitos os eixos usados nos veículos que funcionam com semi-reboques e é essa unidade que está sendo preparada para se transformar em fornecedora das montadoras. Quando isso acontecer, a Facchini, que hoje atende apenas aos transportadores de carga, passará a fornecer também para a indústria automobilística

(Sindlab, 2006).

 

A organização administrativa da Facchini conta com os irmãos Rubens, presidente, e Euclides Jr., diretor comercial, mas as decisões são tomadas em conjunto e alinhadas com a estratégia de manter a atividade como negócio familiar, sustentado sempre em capital próprio e com tecnologia de primeiro

mundo (Sindlab, 2006). A empresa atua em duas áreas básicas - carrocerias sobre chassis e semi- reboque. Os investimentos nessa empresa são feitos de acordo com a necessidade - “no fio da         71

navalha”, como define Euclides. Segundo seus cálculos, nos dois últimos anos foram gastos R$ 30 milhões em expansão e compra de equipamentos. Mas nada foi destinado à publicidade. A Facchini possui atualmente o certificado ISO 9001. Produz a linha completa de implementos rodoviários para caminhões leves, médios e pesados, possui seis fábricas, 30 distribuidores exclusivos, 10 distribuidores no exterior e a produção média de 3 mil produtos por mês (Facchini, 2010). A estratégia atual da Facchini é muito semelhante a da Randon, isto é, ampliar as suas ações do mercado de implementos para o setor de autopeças a fim de se proteger das variações de mercado.

 

A Noma produz implementos utilizando um moderno conceito de linha de montagem, auxiliada por gabaritos específicos, máquinas de corte computadorizadas e robôs industriais. O gerenciamento de toda organização é feito através de um software de gerenciamento contínuo, SAP, uma estrutura que consolida a Noma do Brasil S.A. como um dos maiores e melhores fabricantes de semi-reboques da América do Sul (Noma, 2010). Além do mais detém uma ampla gama de implementos rodoviários, mas a exemplo da Guerra S/A enfatiza que o seu negócio são os implementos rodoviários e não indica pretensões de expandir as atividades para outros ramos correlatos como autopeças.

 

 

  1. 5. LIÇÕES E EVIDÊNCIAS DAS “QUATRO GRANDES”

 

Diferente de países como Estados Unidos e China, de dimensões continentais e demandantes do transporte rodoviário, o Brasil não criou condições para que montadoras de caminhões nascessem para atender o mercado interno oriundas de empresas que atuavam no setor como oficinas. A resposta pode estar no modelo de desenvolvimento no setor implementado no Brasil que deixou as principais empresas nacionais relegadas a produção de implementos rodoviários.

 

 

 

Primeiramente, a política industrial para a indústria automobilística brasileira foi atrair as multinacionais a fim de que produzam os seus produtos no Brasil com elevado grau de nacionalização. Esta política fazia parte da ISI como observa Katz (2005), além do mais nos anos 1950/1960 era difícil uma empresa nacional grande e capaz o suficiente para produzir caminhões. A única que produzia caminhões era a estadual FNM devido a uma necessidade urgente do Brasil, mas no fim da década de 1960 foi privatizada.

 

As empresas privadas nacionais começaram os primeiros movimentos rumo a produção de veículos na década de 1970. Um caso interessante é da Randon que vai se aproveitar do cenário favorável da década de 1970 e investir no desenvolvimento e produção de veículos especiais, em que passou a ser líder do mercado e mesmo com a abertura da década de 1990 ainda é. Inclusive, expandiu as atividades para a produção de retro-escavadeiras e veículos para a exploração madeireira, em am- bos os casos enfrenta a concorrência de grandes companhias internacionais como Volvo, Case e Caterpillar. Então, quais motivos que a levaram a não entrar na produção de caminhões comuns? Uma das respostas pode estar ligada à dura competição com as multinacionais que envolve força da marca, capacidade de desenvolvimento de novos produtos e assesso a novas tecnologias. Portanto, acaba sendo mais fácil buscar se estabelecer em segmentos especiais nos quais é possível ser

competitivo e se associar as companhias para impulsionar a venda de implementos rodoviários.

 

Entre as “quatro grandes” tanto a Randon como a Facchini iniciam o movimento rumo a produção de autopeças também associada às multinacionais produtoras de caminhões e de autopeças. O motivo é que ao longo dos anos essas empresas adquiriram capacidades técnicas e de inovação muito úteis para produzir equipamentos adequados as necessidades brasileiras e muito atraentes para a venda em mercados com características semelhantes, especialmente África e América Latina, pois são

pensados para operações em situações extremas muito diferentes das encontradas nos Estados

72            unidos e Europa.

 

Outro aspecto favorável na associação entre as “quatro grandes” e as montadoras de caminhões é a facilidade de entrar em novos mercados. Por exemplo, quando a Scania começou a comercializar seus caminhões em outros países da América Latina e competir com caminhões usados importados, especialmente dos Estados Unidos, levou consigo produtos da Guerra e Noma, constituindo uma forma de dar um diferencial aos seus produtos e uma maior atratividade.

 

Atualmente, das quatro grandes, apenas a Guerra S/A pertence a um grupo de investidores estrangeiros que não é uma grande empresa de implementos, mas um banco que busca comprar companhias médias que tenham boa rentabilidade. Assim, não espanta que logo a Guerra seja vendida para outro grupo ou volte às mãos da familia Guerra. Em compensação a Randon caminha para ser uma verdadeira multinacional brasileira e uma das cinco maiores companhias do mundo no mercado de implementos e, a Facchini, segue relativamente a mesma estratégia de diversificação e busca de novos mercados de forma discreta, mas eficiente. Além do mais companhias médias e grandes do setor passam a se destacar e podem no futuro próximo transformar-se em conglomerados, com destaque para a Pastre e a Rossetti.

 

 

  1. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O Brasil é um dos maiores mercados e produtores de caminhões do mundo, mas diferente de outros países como a China e os Estados Unidos. Falhou em criar condições para que as empresas nacionais do setor se transformassem em grandes produtores de caminhões ou produtoras de componentes importantes dos veículos tais como motores, caixa de câmbio e diferenciais. Assim, as grandes

 

 

 

empresas do setor hoje são na verdade as produtoras de implementos rodoviários. Aparentemente inicia-se um movimento de tentativa de produção de componentes mais sofisticadados por parte dessas companhias, em especial a Randon e a Facchini. A Randon alçaou a posição dentre as cinco maiores do mundo com produtos cada vez mais diversificados e sofisticados, mas sem sinais que pretenda produzir caminhões. Foi um movimento em parte acompanhado pela Facchini que busca se tornar uma produtora de autopeças. Porém ambas estão longe de produzir um motor a diesel ou linha de caminhões próprias, por exemplo, capazes de competir de igual para igual no mercado.

 

Outra característica a destacar é o movimento comum entre as “quatro grandes” da internacionalização e a procura de novos mercados no exterior associados frequentemente as multinacionais produtoras de caminhões. Neste caso, como aconteceu com outras empresas brasileiras após a virada do milênio, é interessante acompanhar o papel do BNDES tanto no crescimento do conglomerado interno como no financiamento de sua expansão no mercado internacional.

 

Por fim, como afirmam os autores da teoria evolucionária, acabam sobrando no mercado as firmas mais bem preparadas e adaptadas. O desafio atual para três das grandes que restaram é atingir um tamanho tal que evitem ser compradas. Para tanto, podem associar-se entre si ou adquirir concorrentes no mercado interno e externo, seguindo estratégia semelhante à adotada por outras firmas brasileiras internacionalizadas como a Vale, a JBS-Friboi e a Gerdau, para citar apenas três exemplos

paradigmáticos.

 

 

 

 

ÍNDICE DE FONTES

 

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– 178).

 

Publicado

2012-01-05

Cómo citar

[1]
Dalla Costa, A. 2012. Origens e transformações das grandes empresas brasileiras de implementos rodoviários – Pág. 61 a 74: Origens e transformações das grandes empresas brasileiras de implementos rodoviários – Pág. 61 a 74. REVISTA IBEROAMERICANA DE CIENCIAS EMPRESARIALES Y ECONONOMÍA. 3, 3 (ene. 2012).